domingo, 4 de novembro de 2012

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

E, de repente, quatro meses depois, voltou-me a apetecer escrever aqui. Bem sei que nisto dos blogues é suposto a pessoa estar sempre cheia de ideias e vontades irresistíveis, pelo menos quatro vezes por semana, mas a verdade é que nunca tive pretensões de ser uma blogger a sério.
Mas adiante...Nestes meses de reclusão blogosférica, terminei o estágio, passei pelo pior mês laboral da minha vida a trabalhar (ou deverei dizer a escravizar-me?) numa loja, em que as condições são dignas de uma fábrica no Bangladesh, terminei o meu relatório de estágio e entreguei-o a quem de direito, mandei currículos e desesperei com a ausência de respostas. E pelo caminho, passei mais um aniversário, que serviu sobretudo para me lembrar que a minha vida não é nada do que esperei que fosse, que este país não é nada do que gostaria que fosse e que o mundo nunca será aquilo que poderia desejar que fosse.
Mas, queixumes à parte, começo para a semana um novo emprego, que também não é propriamente aquilo que eu gostaria que fosse, mas que vem com um salário e um contrato e, por isso, sinto que, em pleno Outubro de 2012 e com tudo o que se tem passado nos últimos tempos, não tenho qualquer legitimidade para não me sentir com sorte pelo simples facto de alguém me ter empregado - o que, por si só, é um sintoma revelador do estado das coisas aqui no burgo, em geral, e em mim, em particular.

Entretanto, divertem-me as reacções indignadas contra a Cacharel por causa da famosa história da Diana. Pessoalmente, acho que o tiro lhes saiu pela culatra e que o tal perfume é capaz de não vender grande coisa por cá à pala desta brincadeira, mas não deixa de ser curioso o fenómeno que se criou em redor de uma campanha que se pretendia viral e surpreendente e, em vez disso, deixou um amargo de boca às almas românticas deste país... Quão deprimidos e vazios temos de estar para nos deixarmos indignar e entristecer ao descobrir que uma história de amor qualquer é afinal uma campanha publicitária? Que triste que é pensar que o país se agarra àquilo com que a comunicação social o alimenta e se desilude quando a história não corresponde às suas expectativas romantizadas. O que é grave não é a Cacharel ter optado por uma estratégia de Marketing que não agradou... É que essa estratégia tenha conseguido a proeza de por a nú a falta de amor e de esperança que reina na vida das pessoas, e o quão frágeis e permeáveis elas se tornam quando isso acontece...

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Coisas que me irritam (sobretudo à Segunda-feira)

Caro Miguel Araújo,

Lamento imenso se a sua mulher o empalitou com o marido de uma amiga qualquer. Se foi esse o caso, compreendo que certamente deve ser uma situação desagradável.
Ainda assim, não me parece que esse putativo dissabor justifique a criação e divulgação de uma  canção  - que inexplicavelmente se tornou um hit nacional - em que rotula as mulheres como querendo ou cobiçando os maridos das outras, em geral, e das amigas em particular.
Peço-lhe, portanto, que, não me conhecendo (a mim e a muitas mulheres deste País, suponho), não me julgue pela mesma bitola que utiliza para julgar as mulheres com quem possa eventualmente privar.

Agradecida.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

I

A criança que fui chora na estrada.
Deixei-a ali quando vim ser quem sou;
Mas hoje, vendo que o que sou é nada,
Quero ir buscar quem fui onde ficou.

Ah, como hei-de encontrá-lo? Quem errou
A vinda tem a regressão errada.
Já não sei de onde vim nem onde estou.
De o não saber, minha alma está parada.

Se ao menos atingir neste lugar
Um alto monte, de onde possa enfim
O que esqueci, olhando-o, relembrar,

Na ausência, ao menos, saberei de mim,
E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar
Em mim um pouco de quando era assim.

II

Dia a dia mudamos para quem
Amanhã não veremos. Hora a hora
Nosso diverso e sucessivo alguém
Desce uma vasta escadaria agora.

E uma multidão que desce, sem
Que um saiba de outros. Vejo-os meus e fora.
Ah, que horrorosa semelhança têm!
São um múltiplo mesmo que se ignora
.
Olho-os. Nenhum sou eu, a todos sendo.
E a multidão engrossa, alheia a ver-me, Sem que eu perceba de onde vai crescendo.

Sinto-os a todos dentro em mim mover-me,
E, inúmero, prolixo, vou descendo
Até passar por todos e perder-me.

III

Meu Deus! Meu Deus! Quem sou, que desconheço
O que sinto que sou? Quem quero ser
Mora, distante, onde meu ser esqueço,
Parte, remoto, para me não ter.



A Criança que Fui Chora na Estrada, Fernando Pessoa (1933)

segunda-feira, 14 de maio de 2012

...

Quando escrevi as linhas abaixo, não podia imaginar que, poucas dezenas de horas depois, estaria a sofrer mais uma dolorosa e irreparável perda. Antes, faltavam-me as palavras. Agora falta-me o ar.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

...

Podia escrever sobre a minha viagem a Itália e o buraco que me deixou no peito. Podia escrever sobre a aflitiva e injusta morte de Miguel Portas, levado pela doença filha da puta do costume. Podia ainda falar sobre o 1º de Maio e o Pingo Doce, sobre as eleições em França e na Grécia, sobre mais um Dia da Mãe triste e vazio, sobre o egoísmo e a falta de respeito pelo outro que me cansam e desiludem, ou sobre a merda do tempo e a Primavera que nunca mais chega. Podia escrever sobre isto tudo e sobre mais ainda, mas não escrevo. Não escrevo porque, ultimamente, me faltam as palavras e o chão. Porque cada dia tem sido uma luta para me manter à tona, para não me deixar vencer pela tristeza, pela desmotivação, pela falta de esperança em dias melhores. Estou assim, cinzenta como o céu de Lisboa. Até breve.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

É que é isto mesmo, sem tirar nem pôr

A Izzie do "A Arte da Preguiça" escreveu o texto abaixo, mas podia muito bem ter sido eu a escrever. Aliás, gostaria de ter sido eu a escrever.
Porque estou inteiramente de acordo. Porque esta coisa do Estado querer ser nosso paizinho (mas só para dar ordens, cobrar deveres e regular hábitos e costumes, que em matéria de protecção social e económica, é sempre a descer) é perigosa, chocante e faz-me ter medo e vergonha dos contornos que este país está a tomar.

"No meu carro mando eu. Lá dentro usa-se cinto de segurança, carrega-se muita tralha, há uma bagageira atafulhada de porcaria que já me mereceu uma valente rabecada por parte de mamãe (e que aturei estoicamente, porque enquanto mamãe ralhava mamãe arrumava, e há que saber dar valor à família) e fuma-se. Sim, fuma-se. Eu não, porque tenho consciência das minhas limitações e espectro de atenção, e não pego em telemóveis seja para o que for nem distraio as mãozinhas com pauzinhos fumegantes enquanto conduzo, mas fuma quem quiser e se quiser. No meu carro não são transportadas crianças mas, quando são, levam os cintos postos e ninguém fuma, porque somos pessoas com dois dedos de testa que não precisam de lei ou decreto que lhes explique que faz mal. Se há pais ou familiares com sérios problemas cognitivos e que fumam na presença de seus petizes, em ambiente fechado, their bad, não tenho nada a ver com isso, e tal não dá o direito a que se legisle sobre o que se faz no me mobile e, já agora, também lá em casa, porque não, há crianças no prédio e deumalibre de as riquezas sentirem nem ao de longe, muito tenuamente, o cheiro do meu fumo.
Já agora, e antes que se lembrem de mandar a asae bater à minha porta, lá em casa também se come manteiga, muito ocasionalmente fritos, há sal grosso e fino a que se dá uso, e agora multem-me lá, ó pulhas, tranquem-me na penitenciária, a regime de salada durante meses, a ver se me rala, ó fundamentalistas de merda."